quarta-feira, 15 de julho de 2009

Festinhas e Dinâmicas Raciais!

Devia estar trabalhando, mas estou com uma preguiçaaaaaaaa!!! Well, vamos escrever um postzinho para relaxar. Não é segredo pra ninguém que os EUA possui dinâmicas raciais muito diversas. Sente-se isso o tempo todo e, para brasileiros desavizados, essa parada pode parecer estranha ou horrorosa. No meu caso, mesmo no Brasil, me sentia como se entrasse e saísse de dinâmicas raciais o tempo todo. Uma coisa é tomar cerveja na Vila Madalena com estudantes da USP e outra é beber a mesma marca de cerveja no Centrão com meus amigos pertencentes a grupos de pagode, rappers, ladies trabalhadoras do telemarketing e os "nego véio" que, entre uma loira - a cerveja, meu filho! - e outra, relembram os tempos em que eles comiam "todas" (acredite neles se quiser!...). Descrevo abaixo umas festinhas que andei participando aqui nos EUA nas últimas semanas e a dinâmica de cada uma. Espero que o texto consiga captar um pouco do clima das festas, uma vez que eu me diverti pacas nelas!

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Churrasco Universitário/Acadêmico Multiracial e Étnico em Washington DC

Pois bem, no sábado do 4 de Julho estava em Washington DC e fui convidado para ir a um churrasco de um casal de amigos alumni da Cornel University. Ambiente agradável, casa bonita, comida farta, cerveja, vinho e música de estilos variados tocando de forma ambiente quase. A composição étnico/racial dos convidados era uma fotografia do que é o corpo discente/docente dessas universidades elitizadas da Ivy League: eu e Tarik, outro amigo de Cornell, eram os pretinhos básicos do barbecue seguidos de uns asiáticos, mais uns latinos e brancos. Os papos tinham aquele tom típico de smart people conversation: sua pesquisa foi sobre o quê, mesmo? Já leu autor tal? Ainda não, mas ouvi falar! Quais seus planos para o doutorado? Quer ficar morando em Washington ou vai voltar para New York! Ao final da festinha nos dirigimos para um lago onde assistimos uma queima de fogos em comemoração a independência dos EUA que durou 20 minutos. 22:00 and the party is over! Eu e meu amigo ainda tentamos comprar umas brejas no Seven Eleven para tomar em casa, mas... É proibido vender/comprar cachaça em DC depois desse horário. Caso queira beber é necessário ir para um bar. De nossa parte, resolvemos ficar na Coca-Cola!

Churrasco 100% Black na Parte Mais Preta do Brooklyn, Bed Stuy!

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Noite de sábado, 11 de julho. Barbecue em Bed Stuy, Brooklyn. Para quem não se lembra, essa é área onde se passa o seriado Everybody Hates Cris (Todo Mundo Odeia o Cris no Brasil). Desço do metrô na Nostram Station para pegar um táxi já que chovia pacas. A primeira coisa que se nota na partes negras do maior distrito de NYC é a quantidade de policiais: corvos azuis andando por todos os lados ou dentro dos seus blue and white (apelido dado as viaturas). Escondo-me da chuva por uns minutos num tipo de lanchonete cheia de negrada na mesma situação. Um truta corre para a calçada e sinaliza para o táxi. O carro para, mas ao tentar entrar no veículo nosso amigo é impedido por uma policial feminina. Motivo: uma brown paper bag com uma Heneiken aberta dentro (lembrem-se que é proibido consumir bebida alcoolica em via pública nos EUA). O táxi se manda e começa uma discussão interminável entre o brother e dois policiais num tom de voz que seria imaginável em São Paulo. A platéia, protegida da chuva embaixo do toldo do estabelecimento, assiste a discussão que pouco a pouco vira uma espécie de pastelão. O rapaz aponta para a garrafa e diz: "Ela não estava aberta, eu juro." "Você está dizendo que foi ela [a policial feminina] que a abriu?" Pergunta o segundo policial abrindo um sorriso irônico compartilhado pela policial feminina ao que o rapaz responde: "Sim foi ela, foi ela que abriu!" Todo mundo na lanchonete, inclusive eu, cai na gargalhada.

A Bedford Street estava literalmente congestionada devido ao churrasco no número 921. Pretaiada pra todos os lados, de todos as idades, tamanhos e estilos. Chove e muita gente se espreme numa tenda montada em frente ao browstone na qual serve de moradia para meus conhecidos. O corredor que dá acesso ao interior da casa é uma espécie de check in da festa com os mais variados tipos encostados na parede observando e sendo observados. Há os tiozões barrrigudos vestidos a la hip-hop, gostosas de plantão fazendo cara de "não me olhe, não me toque e não fale comigo" e esperando sempre a atitude contrária, rapazes musculosos com camisetas exibindo o corpo malhado, calças largas, bonés, bermudas e tênis e toda aquela parafernália hip-hop que, como diz Mano Brown, "faz crescer o zóio de qualquer ladrão". As tatuagens, inscritas tanto nos corpos masculinos como femininos, demarcam nomes, apelidos, áreas de origem, filhos e amantes como se fossem mapas sociográficos que informam e individualizam. Todo mundo segura um copo ou tem um litrão de algo na mão. Um brother veste uma camiseta cuja estampa me faz cair na gargalhada de novo: "Orgasm Donor". A primeira imagem que vem a cabeça é o videoclipe de um clássico de Notorious B.I.G, One More Chance. Nada descreveria melhor a festa!

Depois de vários empurrões, caras feias, trombadas, pisadas em pés e outros acidentes encontro meu amigo Omare Kinsey. Desfaço-me da caixa de cerveja que trouxe e vou dar uma volta pela área. Um bar havia sido improvisado na sala, há uma fila enorme para pegar um liquor e o barman soa feito burro devido ao calor e ao trampo. Tips são bem-vindas, deixe a sua! Depois de um bom tempo na fila consegui sair de lá com um copo de Hennessy - conhaque frânces que virou coqueluche entre rappers - com gelo. Os sofás da casa parecem ser reservados a diretoria do barato ou as mulheres da diretoria. Bem no meio da sala, três garotas trajando vestidos curtos e colados que reassaltam as já protuberantes pernas, coxas e peitos ficam paradas numa posição estratégica. Não há quem não deixe de olhar! A rima de B.I.G no refrão da canção Big Poppa resume a parada: If you got a gun up in your waist please don't shoot up the place/Cause I see some ladies tonight who should be havin my baby/Bay-bee! Tento ir para o quintal, onde uma muvuca de gente disputa Coronas e um churrasquinho (leia-se hamburguers e hot dogs), mas um casal mandando ver num grind dance bloqueia a passagem no corredor que dá acesso. Depois que os dois se casam dos exercícios de alongamento, consigo ir para o backyard. Mais muvuca! Chove e todo mundo se aperta tentando ficar debaixo da cobertura que foi montada e dar uma dançadinha ao som do hip-hop e ragga que sai das caixas de som. Paro para tomar um gole de minha Corona recém pega e novamente caio no riso ao ver os dízeres da camiseta de uma garota: "Fuck Me, I Am Famous!"

Okay, havia um tópico sobre o consumo de drogas - weed - na festa aqui, mas ele foi censurado pelo Blogspot!!!!!!!!

Um tiozão com cara de bêbado para na porta da sala e começa a gritar: "All right, all right! Chicken is being served in the other side of house... CHICKEN IS BEING SERVED IN OTHER SIDE OF HOUSEEEEE!!!!

Ando um pouco pelo quintal e me vejo diante de mais surpresas. Até o momento não tinha visto um branco na festa, mas de supetão topo com um grupo de quatro, três garotas e um rapaz. Todos com feições que indicavam ser estudantes universitários, eles riam e tiravam fotos de si mesmos. O rapaz pede-me para tirar uma foto do grupo e eu mando ver na câmera nas minhas habilidades, nada boas, de fotográfo amador. Olhando de novo para o grupo lembrei de meus amigos brancos de graduação na USP quando os convidava para algum baile black. A resposta era sempre numa pegada do tipo, "Porra Kibe, mas os caras lá não vão me discriminar, não?" Dos que foram, não lembro de ninguém ter reclamado, mas curtido pacas. Voltando a festa, minutos depois sou apresentado por Omare a algumas estudantes da New York University (NYU) que estão na festa. Falo que sou brasileiro, mas não sou de Salvador, já que toda vez que digo minha nacionalidade para os patrícios da América do Norte logo me perguntam da Bahia! Minha afirmação causa polêmica e dali a alguns minutos estou numa discussão elétrica com uma estudante de doutorado em história sobre as tensões envolvidas na construção de uma identidade nacional e a noção de democracia racial no Brasil. Intelectuais, sempre chatos e inconvenientes! A namorada de Omare nos traz de novo pro chão: "What is hell nation construction thing? This is a barbecue and you supposed to be talking about beer and chicken!"

Volto a sala para reabastecer meu copo. Passa das duas da manhã, não há mais cerveja e a única opção é liquor. Saio do bar com uma dose de Jose Cuervo com gelo. Urgh! Imagino a dor de cabeça que terei no outro dia. Tem início uma sessão de ragga e soca levando a negrada a loucura. Os ritmos caribenhos tiram todo mundo do chão e do sofá, até as gostosas com cara de "não me toque, não olhe e não fale comigo" saem de sua pose habitual e vão para a meio da sala dançar! Viro minha Jose Cuervo (a essa altura já sem gelo) e caio na pista! Pois bem, depois disso não me lembro de muita coisa... Apenas de, armado de uma taça de vinho branco, pegar uma carona com truta que me levou até a Bedford Station onde peguei o metrô de volta pra casa. Já passava de cinco da manhã e minha única companhia eram os ratos novaiorquinos que infestam os trilhos e plataformas das estação do metrô a essa hora. Hungover animal no domingo, mas ainda tinha uma salsa para ir...

Salsa "F"oderosa, Impossível Não Dançar!

Havia sido convidado dias antes para ir a uma festa de salsa por Eli Efi e sua esposa DJ Laylo. Laylo iria tocar e a evento seria uma espécie de celebração anual de uma importante e histórica gravadora de salsa music nos EUA, a Fania Music. Não sou um grande fã de salsa, mas resolvi colar para conferir e prestigiar a performance de minha amiga. Além dela, iriam se apresentar os DJs Bobito Garcia, NYC, DJ Sake, SF, além do som ao vivo da banda Ilu Aye. Estava curioso também ara ver de perto a figura de Garcia, a.k.a Kool Bob Love, uma vez que costumava ler seus textos na The Source Magazine ainda nos idos dos anos noventa e dele ser uma figura importante no hip-hop e cultura de rua de NYC. Como bom brasileiro que sou cheguei atrasado, por volta das 22:00 sendo que a festa iria até às 0:00. O clube ficava na 96 Lafayette, em lower Manhattan, mas acabei errando a estação do metrô que deveria descer. Resultado: perdi a performance de Laylo e da banda.


(cartaz da festa)

O clube era pequeno, mas aconchegante. O espaço não estava lotado e o clima era agradável com uma acústica que é difícil de se encontrar nas melhores casas de SP. Encontrei Eli Efi e fomos tomar tomar ''uma" básica - como se diz no Brasil "para rebater" - e conversar. No palco, após a apresentação da banda, desceu um telão que mostrava imagens de músicos que gravaram pela Fania e que se situavam majoritariamente nas décadas de 1970/1980 em NYC e Miami. A composição do público era algo interessante. A maioria era de latinos, mas as marcas que distinguiam negros e brancos não ficavam tão evidentes. Percebi que ali era o espaço mais próximo de minha experiência no Brasil no que diz respeito relações de grupos "raciais" e etnias. Havia brancos e pretos, claramente observáveis, mas havia ainda outros indivíduos que poderiam ser facilmente classificados nas infinitas categorias intermediárias que compoem a ideologia racial de muitos países na América Latina.

Bobito começou a tocar. Seu set foi marcado por clássicos da Fania e o público acompanhava todas as músicas de forma energética. Continuava conversando com Eli Efi, mas observava a animação em que o clube se encontrava. Algo parecido só tinha presenciado nos bailes nostalgia de SP quando se tocava samba-rock e todo mundo passava a disputar a tapa um(a) parceiro(a) para se dançar. O prazer estava simplesmente na dança, não importava qual fosse o par. Eli Efi foi fazer algo e fiquei sozinho tomando minha Heineken. Dentro de minutos a cerveja havia acabado, mas, milagrosamente, alguém pagou por um taça de vinho que não pegou no balcão do bar e eu, sempre rato, logo a surrupiei. Pois bem, a música era tão boa que dentro que alguns minutos estava dançando sozinho e agradecendo mentalmente Eli Efi e Laylo por terem me convidado para a festa. Alguns casais davam show na pista e eu, já animadinho pelo vinho, resolvi chamar uma senhorita para dançar. Meu background como dançarino de samba-rock dizia que a tal de salsa não era tão diferente e que eu daria conta do recado. Triste engano, o barato era mais complexo do que eu pensava e dei vexame com minha parceira. Tristonho e envergonhado voltei para o meu canto do salão. Aulas de salsa no próximo semestre...

http://www.hiphopslam.com/_OLD/news/g/033/BADJ021_Sake-1.jpg
(DJ Sake)

DJ Sake fechou a festa com uma set incrível que praticamente aproximava/mixava salsa e hip-hop. Batidas compassadas e "F"oderosas. Ao final, já com a luz acessa, subi a cabine dos DJs para dizer um alô a Laylo e agradecer pelo convite. Topei com Sake e disse que havia gostado muito de sua performance. Ele agradeceu e, rindo, comentou que um cara havia lhe perguntado se aquela festa rolava todo domingo. Eu, ele e Laylo rimos ao que eu disse: "It would be good, man, it would be good!..."


Muita Paz e Amor a Todo(a)s!

7 comentários:

Flavio disse...

Hum, quando disse que fui aos bailes de Salsa em D.C., vc torceu o nariz. Agora é legal, né?

Flavio disse...

Uma pena eu não ter pegado uma festinhas dessas enquanto estive aí.
Abraço!

Renata disse...

Putz Kibe, ler seu post me deu uma saudade de NYC... Especialmente do Brooklin, só dei um rolê rápido por lá, perto da área do Prospect Park, bem bacana.
Quanto a festas eu não posso reclamar, pois fui a baladas em LA, San Francisco, NYC... Tive uma impressão parecida com a sua na maioria dos lugares, tudo bem racialmente segregado.
Agora nem me fale de churrasco na gringolândia, fui a um em Berkeley que parecia piada, tinha até cogumelos e hamburguer de tofu na grelha, tudo menos a nossa suculenta picanha. Eles definitivamente não sabem o que é carne...rs...
bjocas

Márcio Macedo disse...

Flávio,

Como você sempre soube, já que me conhece bem, eu sou um expert em se estrepar nas minhas próprias afirmações. Ora, aqui não seria diferente. Mas lembre-se que começo o meu post já dizendo que não sou um grande fã de salsa, entretanto, estou prestes a mudar minha opinião após minha experiência de domingo. Grande festa (aliás, "grandes festas", a do Brooklyn também foi ótima!) só faltou você lá para tomar um Henessy, algumas Coronas e dançar uma salsinha.

Abraço,

Márcio/Kibe

Márcio Macedo disse...

Renata,

You are missing NYC because right now you know how we do in NYShittttttt!!!

Beijos,

Márcio/Kibe.

Klaudiah disse...

Quando se ta no mundo tem que se experimentar de tudo, abandonar velhos conceitos e pré conceitos. Nunca iria no "gueto" pra festa, mas se tivesse no "real gueto", who knows?!
Mas Salsa é muito bome recomendo. dançar a dois é bom e não existe somente o samba rock para isso. A salsa aproxima mais as pessoas... sem querer menospresar o seu samba rock ai do sul.

Mila Felix disse...

Rindo alto, imaginando você na festa de salsa . . . e pedindo à Deus para conhecer 1 festa preta no Brooklyn!