quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Maldadezinhas de um Negro Metido: W.E.B. Du Bois


Era 1990 e eu caminhava com John Hope Franklin, o segundo mais famoso acadêmico negro [dos EUA], pelos montes de Belagio, Itália. Nós estávamos participando de uma conferência organizada pela profética figura de Marian Wright Edelman para crianças negras pobres. Acima de nós, o céu era um bebê azul. Abaixo de nós, o Lago Como estava confortante e calmo. Professor Franklin, um homem de grande dignidade, com um sorriso encantador, estava num espírito reflexivo.
"Cornel," ele disse, "deixe-me lhe contar uma história que raramente compartilho. É sobre mim e W.E.B Du Bois (foto acima)."
"Uau! Você conheceu ele bem?"
"Ninguém conhecia ele muito bem, mas meu primeiro encontro com ele foi extraordinário."
"Como foi?"
"Eu estava em um hotel na Carolina do Norte em 1938. Reconheci W.E.B Du Bois sentado no salão de espera. Ele estava lendo jornal. Abordei ele com grande respeito e excitação.
"'Doutor Du Bois,' eu disse, 'bom dia, senhor. Meu nome é John Hope Franklin.'
"Du Bois não reagiu. Seus olhos mantiveram-se fixos no jornal a ponto dele nem mesmo reconhecer minha presença. Não importava, eu não estava de saída mesmo. Além de tudo, aquele era o grande W.E.B. Du Bois.
'Doutor Du Bois,' eu reiterei, 'eu fui batizado John Hope, mesmo nome do presidente da Universidade de Atlanta.'
"Ainda, sem reação. Mas Cornel, eu não podia imaginar sair dali sem alguma interação. Então, no último minuto, eu disse, 'Senhor, eu sou estudante de pós-graduação em Harvard, no mesmo programa que o agraciou com um Ph.D.'
"Após vários longos segundos de silêncio, Du Bois me deu uma rápida olhadela superficial. Uma olhadela, aborrece você, não uma palavra. Lentamente me retirei."
Quando olhei dentro dos olhos de John Hope Franklin, podia ver lágrimas internas de decepção. O incidente poderia ter ocorrido meio século atrás, mas o Professor Franklin fez parecer que tivesse ocorrido ontem.
Minha primeira reação foi, caso isso tivesse acontecido comigo, que teria estapeado Du Bois retoricamente da cabeça aos pés e dito, "Você poderia ao menos dispensar alguns segundos para dizer olá." Mas numa reflexão posterior, reconheci que ele era quem ele era - um lutador pela liberdade intelectual e um elitista. Vim a entender que todo mundo é o que é, nada mais. Acredito que o Professor Franklin, embora com o coração quebrado, chegou a mesma conclusão. A nota de rodapé feliz para esta história é que anos depois Du Bois e Franklin tornaram-se amigos. Será que Du Bois um dia percebeu quem ele se negou a reconhecer naquela manhã na Carolina do Norte? Nós nunca saberemos.
O que significa ser uma pessoa educada? Honrarias acadêmicas e títulos de doutorado são uma medida de educação, mas experiência de vida e humildade são outra. ("Teachable Moments" in Brother West, Living and Loving Out Loud: A Memoir, [West, 2009, páginas 238-239]).

Muita Paz!
* Post escrito ao som de Al Green (várias)...