sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Minha vidinha interiorana 1: uma visita a livraria e encontro com John Updike

Limeira Limeira (foto abaixo da gruta da praça central)... Dois dias atrás ia passando em frente a uma das poucas livrarias que há na cidade (acho que são duas!) e resolvi entrar e dar uma xeretada nos livros. Leitore/as assíduo/as de livros estão sempre em busca de uma pechincha e pensei que essa seria a minha chance. Livrarias aqui são um misto de banca de revistas, papelaria e, finalmente, livraria. A moça, negra e com sotaque que remete ao nordeste, me atendeu com um sorrisso e o clássico "posso ajudar."  Abri outro sorrisso e disse que estava apenas dando um olhada. Não havia quase ninguém no local no final da tarde, algo beirando às 17 horas.

Na verdade, minha curiosidade era descobrir que tipo de livros são expostos nas prateleiras de uma livraria de minha querida cidade natal. Pois bem, descobri. Basicamente as obras de indivíduos cujo os nomes tem algum tipo de repercussão na TV ou revistas de grande circulação como a jornalista Miriam Leitão, o escritor/jornalista Fernando Morais e outras figuras que não preciso citar aqui, são aqueles que estão expostos na, digamos, prateleira principal. Na segunda prateleira há uma série de livros embrulhados em sacos plásticos transparentes - para evitar a poeira - e que já evidenciam o peso da idade devido as capas e páginas amareladas por conta da ação do tempo. A solícita atendente caminha até a minha pessoa e, apontando a prateleira citada, explica que os livros dali estão em promoção: metade do preço original. Animo-me e vou checar os valores que, mesmo com a promoção, não soam nada apetitosos para um estudante de doutorado quebrado como eu. Os títulos são os mais variados e prevalecem os romances. Muita coisa velha das editoras Companhia das Letras e Record, mas títulos que não me agradam muito (leia-se "não ando a fim de ler") no momento como Milan Kundera, Gore Vidal, John Updike, Rubem Fonseca e por aí vai.

Em outra prateleira, já próxima das revistas, é possível ver a coleção Folha Explica na qual especialistas de várias áreas são convidados a escrever e explicar temas complexos contemporâneos de forma sintética. Gosto dessa coleção e noto como a mesma foi inspirada pela famosa coleção Primeiros Passos, da saudosa editora Brasiliense. A propósito, essa série foi idéia de Luiz Schwarcz na época que trabalhou na Brasiliense e alguns anos antes de fundar sua própria editora, a Companhia das Letras, com sua esposa Lilia Moritz Schwarcz. Vejo vários títulos que fico com vontade de ler, mas o preço não é nada convidativo. E eis que mais uma vez a atendente amiga me auxilia...



Dessa vez sem se aproximar muito de mim ela aponta uma prateleira localizada no alto de sua cabeça e diz que os livros ali, também embrulhados em sacos plásticos transparentes, estão numa promoção especial: R$ 9.90. Ok, acho que finalmente achei algo que se encaixe em meu bolso humilde, mas seletivo. Caminho até a prateleira e começo a verificar os títulos. Logo de cara encontro um clássico da antropologia perdido: Sexo e Temperamento, de Margared Mead (que algum estudante de ciência sociais deve ter encomendado e esquecido de ir buscar). Fuço mais um pouquinho e encontro um Charles Baudelaire, A Arte da Crítica. E, por fim, para ganhar o dia, um livro desconhecido do sul-africano J.M. Coetzee. Olha Limeira aí fazendo a minha alegria. Mas o que me chama a atenção tanto nessa prateleira de livros a R$ 9.90 como na outra que eles custam do seu preço original é a quantitade de títulos do escritor norte-americano John Updike (1932-2009). Updike ganhou notoriedade por ser um fiel observador da classe média norte-americana entre as décadas de 1960 e 2000, um tema que acho extremamente chato. Ele fez fama com os "romances coelhos": uma série de livros cuja as publicações vão de 1960 à 2001 e nos quais Updike explora a vida do personagem Harry "Rabbit" Angstrom do seu nascimento a sua morte. Na minha adolescência li dele Brazil (1994), um livro que foi escrito por conta de uma visita do autor a nossa querida pátria varonil. Nessa obra o escritor norte-americano se utiliza do trama da tragédia grega Tristão e Isolda para contar a história de amor entre um rapaz negro/mestiço oriundo das classes populares com a garota branca e loira pertencente a uma família das elites dominantes. E a história se passa num período bastante especial: momentos antes do golpe militar de 1964. Eu, sinceramente, hoje acho o livro bastante clichê e com um olhar distanciado do Brasil, um Brasil com "z" mesmo, para um autor rotulado como realista.  Entretanto, confesso que quando li o livro pela primeira vez gostei: luxos e ingenuidades da mocidade. Mas ainda me pergunto: porque tantos Updikes para Limeira, hein? A classe média daqui gosta de música sertaneja, rodeio e é católica.

Pois bem, assim que tiver um din din voltarei a livraria e pegarei os meus três achados - Mead, Baudelaire e Coetzee - já que tenho certeza que ninguém irá comprá-los. Há muitos Updikes na frente deles.

Muita Paz!